quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Paralelos entre o momento atual e 1954

Um dos objetos mais frequentes de meus comentários aqui tem sido os paralelos entre momentos históricos do passado e do presente, tentando desvendar os mecanismos deste misterioso sincronismo que faz com que os eventos do passado se repitam, ou pareçam se repetir no presente. Uma comparação que tem sido cada vez mais repetida nos forum´s e redes sociais correlata a crise do governo Dilma com a crise que levou Vargas ao suicídio em 1954. Assistindo ao declínio do atual governo petista, nota-se que a queda de Vargas em 1954 foi precedida de um roteiro semelhante, com muitas acusações de corrupção, CPI´s, campanhas na imprensa, etc. Hoje é perfeitamente sabido que por detrás daquilo tudo havia um projeto de conquista do poder por um grupo direitista centrado na UDN e na ESG (Escola Superior de Guerra) dentro do contexto da guerra fria e da subversão comunista.

Estaria acontecendo a mesma coisa nos dias de hoje? Desnecessário dizer que a grande maioria dos petistas jura que sim. Mas é preciso examinar os fatos um a um. Semelhanças, há: um governo dito de esquerda e nacionalista, pessoas se beneficiando de sua proximidade com o poder, maioria da imprensa contrária, políticos querendo derrubar o governo via impeachment. Mas as diferenças também são flagrantes:

- Mais importante de todas: as investigações contra os petistas estão acontecendo dentro de órgãos que foram predominantemente montados, senão aparelhados pelo próprio PT - o MPF, o STF e a Polícia Federal. Os mensaleiros foram condenados por um plenário onde a grande maioria dos ministros havia sido nomeada pelo PT.  A atual Polícia Federal também teve seus quadros montados em grande parte na era petista. As leis que facilitam a investigação da corrupção, inclusive a delação premiada, foram aprovadas com o apoio do PT. Pode-se no máximo acusar, sem provas, Joaquim Barbosa e Sérgio Moro de terem simpatias pelo PSDB.

- Não mais existe a polarização Esquerda X Direita nos moldes que havia durante a guerra fria. Conceitos como "perigo comunista" e "conspiração da CIA" atualmente só existem para quem esqueceu a cabeça nos anos sessenta. O principal opositor do PT não é um partido de direita como a antiga UDN, mas o PSDB, um partido de centro-esquerda.

- Não existe um antagonista do calibre de um Carlos Lacerda, capaz de galvanizar a oposição apenas com seu carisma pessoal. Os políticos que querem derrubar Dilma com o impeachment são notoriamente medíocres, movidos por ambições pessoais, e não por razões ideológicas. Nenhum observador sério acredita que se Dilma sair, o país vai cair em uma ditadura de direita.

- A dita "Republica do Paraná" não é igual à antiga Republica do Galeão. Em 1954, a aeronáutica já era hostil a Vargas desde antes do atentado a Lacerda. A Polícia Federal e a Justiça Federal são crias do PT.

- A imprensa, hoje, não tem o mesmo poder que tinha 60 anos atrás, pois atualmente há muitas outras mídias na internet que podem servir como formadoras de opinião.

- E por fim, falta o lance trágico: a tentativa de assassinato de Lacerda e o suicídio de Vargas.

A conclusão a que chego é que há mais imaginação do que paralelo histórico. Se há um paralelo efetivo entre os dois momentos, é quanto ao surto de corrupção inerente ao modelo nacional-estatista moldado por Vargas e adotado pelo PT, que invariavelmente cria um séquito de empresários amigos-do-rei em torno do Estado. A diferença é que, na época atual, há meios mais efetivos de investigar e levar aos tribunais os corruptos. A verdade pode ser dita sem grandes volteios: o PT agiu como o macaco que prendeu a mão na cumbuca, e acabou caindo na arapuca que ele mesmo montou ao fortalecer a Polícia Federal e aprovar leis anticorrupção, tudo isso para em seguida mergulhar em práticas corruptas como se não houvesse amanhã. Mas como, afinal, os petistas, que já deram provas de muito melhor organização e visionarismo no passado, foram agir de maneira tão inábil?

Aí só posso especular. Talvez acreditassem que a prosperidade da primeira década fosse eterna, e então o eleitor poderia continuar relevando a corrupção como sempre fez durante os períodos bons da economia. Ou talvez, como afirma o dístico popular, quem nunca comeu manga, quando come se lambuza.

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