quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Ciclo social-democrata imperfeito?

É quase unanimidade que o país se aproxima do fim do ciclo petista. Mas em meio a tantas conclusões fáceis, felizmente ainda há aqueles que preferem fazer abordagens mais acuradas. Um interessante exemplo está nesse artigo do GGN, de Marco Aurélio Nogueira, no qual o autor sugere que estamos, na verdade, próximos ao fim de um ciclo mais amplo, de hegemonia PSDB-PT, que ele denominou ciclo social-democrata imperfeito.

Eu já havia me referido aqui em artigos anteriores ao que chamei a gangorra PSDB-PT, protocolo não escrito que tem garantido a hegemonia desses dois partidos na vida política brasileira nos últimos 20 anos. Havia pouco eu julgava que essa gangorra continuaria em movimento, mas diante da radicalização dos discursos, tenho que considerar a hipótese do fim de todo esse ciclo. Poderia, de fato, ter sido a porta de entrada para um steady-state virtuoso, tal como existe nos países mais desenvolvidos do mundo, onde o jogo político é claro, previsível e atende às expectativas da maioria da população, mas encerrando-se abruptamente nesse segundo mandato de Dilma, deixa no ar a incógnita do que virá em seguida.

Como explicar porque esse ciclo se manteve, e ao mesmo tempo, porque ele se quebrou?

O fato é que as duas metades desse ciclo - o PSDB e o PT - ao mesmo tempo em que se encaixam perfeitamente, se repelem violentamente. O PSDB aplainou o caminho para o PT, ao estabilizar a economia e promover a austeridade que era indispensável, mas que o PT, por questão de princípios, não poderia jamais promover sem se desmoralizar junto às bases. Mas o PT sempre procurou rejeitar com veemência qualquer insinuação de que teria uma herança benigna vinda dos tucanos, ainda que no primeiro governo Lula tenha mantido escrupulosamente a macro-economia herdada de FHC. Ao contrário, e surpreendentemente, o PT procurou se compor com aqueles políticos que figuram entre os mais conservadores do espectro político brasileiro, e que jamais foram social-democratas. No imaginário popular, permanece até hoje a noção de que PT e PSDB são o exato oposto um do outro.

Até o início do primeiro governo Lula, visitando a página e lendo os estatutos do partido, eu pude ver ali veementes negativas de que o PT defendia a social-democracia; ao contrário, os estatutos diziam textualmente que o propósito do partido era "acabar com o capitalismo". Entretanto, a implementação possível do ideário petista nesses 12 anos tem sido o que se pode conceituar de uma tardia social-democracia à europeia, com o aumento de impostos e benefícios diversos à população. Foi assim enquanto dinheiro houve. Já o PSDB, por seu turno, acusado de ser neoliberal e inimigo dos direitos sociais, jamais se assumiu como tal, embora tenha de fato implementado algumas políticas nesse sentido como condição indispensável para debelar a inflação. Assumidamente social-democrata, o PSDB nunca praticou a social-democracia enquanto esteve no poder - deixou esse papel para o PT, que sempre rejeitou ser social-democrata.

O fim do ciclo aconteceu no momento em que a força de repulsão finalmente sobrepujou o encaixe entre as duas metades - precisamente quando Dilma consumou o rompimento com os fundamentos do Plano Real e a responsabilidade fiscal herdada dos tucanos, retornando ao nacional-desenvolvimentismo esgotado desde os anos oitenta. O que virá agora? Um novo FHC preparando o terreno para um novo Lula? Ou vamos entrar em um terreno totalmente desconhecido?

Quem viver, verá. Só tenho a impressão de que não será dessa vez que nos tornaremos um Estado de Bem-Estar Social.

Um comentário:

  1. PSDB não fez a social-democracia por um simples fato obvio: Não tinha dinheiro.
    PT tentou fazer a social-democracia mesmo não tendo dinheiro (não tinha, não tem, e digo que nunca terá). Funcionou enquanto o super-ciclo das commodities vigorava e dai que vinha o dinheiro (leia-se: O PT comprava voto da parte improdutiva ou subprodutiva da população tirando dinheiro da parte produtiva da população).

    O governo do PSDB, de fato, fez em maior parte a coisa correta: Identificou-se porque o Brasil não pode ter uma social-democracia (não tem dinheiro) e fez ajustes nessa direção. Só que o PSDB só teve oito anos, e esses oito anos não foram o bastante para ajustar tudo. O lógico seria o PT perceber essa realidade e fazer os ajustes, modernizando o país e assim criando a condição monetária para uma social-democracia, o que nunca ocorreu. No melhor, segurou o status quo. O Brasil de 2015 não é muito mais moderno que o de 2002.

    Sim, fica claro que o ciclo politico atual está no fim. Se Lula acha que vai preservar esse ciclo, está muito errado. A questão é que, impeachment ou eleição em 2018, o que vem depois?

    O PMDB não tem centro ideológico forte, e é um grande candidato á mandar no país nos próximos anos - seja por impeachment de Dilma com Temer no lugar ou na eleição de 2018. Mas o PMDB não tem ideologia nem projeto de país, é uma grande confederação de caciques e coronéis que representam o que há de mais retrogrado e falho no país - Renan Calheiros, Jader Barbalho, José Sarney, etc.

    Eu não estou muito positivo. Vejo entre pessoas jovens como eu um interesse crescente nas idéias de livre-mercado, redução do estado, etc. Mas esse pessoal é um grupo pequeno e sem partido, sem voz excerto a internet. A internet está destruindo a midia tradicional - quem tá ai pro que a Globo acha quando eu posso ler um blog ou forum ou site de noticias internacionais que é bem mais interessante?

    O tempo talvez ajude. Nesse sentido, precisamos de uma renovação de quadros. Esses velhos criados á base de nacional-desenvolvimentismo precisam ir pro asilo, rápido. A tecnologia avança, os tempos mudam, mas parece que é sempre a mesma porcaria em Brasilia. Um bando de advogados velhos discutindo uns com os outros. Esses senhores ai nada sabem sobre como gerir uma economia globalizada numa época de computadores, comunicação instantânea, automatização, biotecnologia, etc.

    O que o Brasil necessita agora é um ciclo liberal-conservador - tirar limitações, destruir lobbies e monopólios estabelecidos, enxugar o estado, criar uma base para uma economia capitalista saudavel do século 21 e resolver o problema demográfico do Brasil, evitando o envelhecimento do país e assegurando prosperidade continua.

    Leia O Ajuste Inevitável, a realidade é que ou o Brasil adota uma politica liberal por necessidade, ou o país está condenado á envelhecer e morrer pobre e irrelevante, como uma Argentina com clima melhor.

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