sábado, 5 de abril de 2014

Fascismo à brasileira?

Comentando o texto abaixo postado, que me foi enviado por um correspondente, achei que tinha altos e baixos. O autor tem conhecimento exato de alguns fatos históricos referentes ao fascismo, mas insiste em encaixá-los nos chavões mais recorrentes do momento.

Em primeiro lugar, eu concordo que no momento atual, no Brasil, está havendo uma certa aproximação, fenômeno aliás sem precedentes na história recente, de parte das classes média e alta com ideais semelhantes aos que formaram o caldeirão social do fascismo no início do século 20. Isso é notado no aplauso recebido por certar produções como o Tropa de Elite, e no aplauso recebido por certos episódios da vida real, como a ação dos "vigilantes" contra os pivetes e os comentários da Rachel Sheherazade. Vou retomar este tema mais adiante. Primeiro vou falar das colocações que achei errôneas.

Não concordo que historicamente a adesão inicial ao fascismo tenha sido um fenômeno típico das classes dominantes desesperadas e das classes médias empobrecidas. Isso está inclusive em contradição com outras colocações do autor do texto, pois no momento atual, as classes dominantes NÃO estão desesperadas e as classes médias NÃO estão empobrecidas. Quem conhece a História sabe que o fascismo surgiu nas massas e não nas elites, como um contraponto ao comunismo, tanto o primeiro quanto o segundo derivados do positivismo do século 19, que por sua vez foi a primeira doutrina de engenharia social da História. Fascismo e comunismo disputaram o mesmo público de operários, intelectuais e indivíduos desajustados de toda a ordem, enquanto as classes alta e média conservadoras permaneciam alinhadas ao que sobrara dos partidos liberais. O próprio autor do post reconhece isto sub-repticiamente ao comentar a ascensão do nazismo no início dos anos trinta, quando houve um enorme ganho de votos para o partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães. Esta virada ocorreu porque os eleitores comunistas começaram a migrar em massa para o partido nazista, desequilibrando a balança e tornando o partido social-democrata minoritário. A adesão das classes alta e média se deu posteriormente, uma vez que esses indivíduos constataram a falência dos partidos liberais, e de fato preferiam o fascismo ao comunismo. Isto porque o fascismo, ao menos, não abolia formalmente a propriedade privada dos meios de produção, embora invertesse a relação antes prevalente entre política e capital: nos antigos regimes liberais, os burgueses comandavam o governo; sob o regime fascista, é o governo que comanda a burguesia (na realidade, o fascismo cria uma burguesia para seu uso, favorecendo os empresários amigos e enriquecendo os seus próceres, ao mesmo tempo em que persegue e expropria os burgueses não cooptados).

Mas concordo com o autor quando ele lembra que a adesão ao fascismo da parte de indivíduos antes não seduzidos por esta doutrina é causada pelo desencanto com a situação presente e a constatação de que os governos em exercício são incapazes de superar as crises. Isso está efetivamente ocorrendo no Brasil. A classe média tinha grandes esperanças no PT, julgando que este partido moralizaria a política brasileira, e experimentou grande desilusão ao ver o PT protagonizar escândalos de corrupção e aliar-se a políticos notoriamente reacionários e corruptos. Decepcionou-se igualmente ao ver que o PT não dava prioridade à educação nem à segurança pública, ao contrário, cortejava ignorantes e marginais, estes apresentados como emblemáticos da autenticidade popular contraposta à elite arrogante supostamente encarnada pela classe média. Sobretudo o problema da segurança é especialmente sensível para a classe média, assustada pelo crime e cansada de ver as ilegalidades cometidas pelos favelados sendo toleradas por governantes e urbanistas. São esta as efetivas causas da aproximação da classe média com ideologias de ruptura, e não o sentimento pueril de "declassément" só porque os pobres agora são vistos circulando em ambientes antes exclusivos aos ricos.

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